domingo, 27 de julho de 2008

Audiorama + SOMTRÊS

Simplesmente sensacional este site. Além de um catálogo super completo de marcas de aparelhos vintage, traz uma seção com as capas dos 10 anos da extinta e saudosa “SOMTRÊS”. Revista criada e editada por Maurício Kubrusly (o próprio).

O misterioso disco compacto de 1979, o ultra-futurístico vídeo-disco, os mini-hacks, o som nos carros, a praga dos “3 em 1”, a revolução do vídeo, a febre dos games e do walkman, a chegada do videotexto (a saber). Parafernálias sortidas e inimagináveis. Sem contar coisas até bem atuais, o rescaldo cultural do Rock in Rio 1 e os ecos das “Diretas Já”.

Tudo lá, com uma excitação ingênua que só o tempo é capaz de deixar ainda mais saborosa.

Faz lembrar como deve ter sido legal quando você precisava montar o próprio som, na era dos modulares – ‘megalomania’ que é a cara dos anos 70.

Atualmente, com o advento mp3 e os mini systems, que invariavelmente tomam um pau de qualquer antigo somzão, parece que ninguém mais liga para isso.

Quem hoje compraria a “SOMTRÊS”?

Sinto-me um verdadeiro E.T. esquadrinhando sites e casas de usados para tentar montar o meu primeiro. A edição número 2 seria uma mão na roda.

Algumas chamadas de capa são hilárias, como “O que Elvis Presley achou do Rock in Rio”, “O avanço do cassete de áudio digital apavora todo o mundo”, "Exclusivo: esta revista não contém nenhum balanço da década”, “Rolling Stones xingam os Beatles”.

E ainda consegue ser impressionante a variação de preço a cada edição.

Descontado o senso estético ímpar da época, algumas capas são até bem legais. Mas nada redime a primeira delas, trazendo a “volúpia” (bota aspas) de Zezé Motta (Glória Maria?). Em papel laminado, de brinde, de oncinha.

O som, por obséquio.


Leonardo Rodrigues

segunda-feira, 21 de julho de 2008

1001 Discos Para Ouvir Antes de Morrer


Finalmente tenho em mãos esta bíblia/guia/enciclopédia/tijolo. Compilação encabeçada por Robert Dimery e Michael Lydon (co-fundador da Rolling Stone) que traz, além de belas imagens, uma penca de resenhas assinadas por críticos internacionais. Quase todas muito boas. Respeitando ordem cronológica, numa espécie de raio-X da história da indústria do disco.

Omissões e inclusões indecorosas à parte - naturais mesmo a algo tão extenso -, a lista é bem sensata. E é só uma lista de discos, pois.

Por um lado, a atenuante constatação de que boa parte deles não de hoje integram minha liturgia musical. De outro, a inevitável sensação de pequeneza frente a capas e nomes nunca dantes vistos mais rechonchudos.

Mas o melhor é a contribuição da força-tarefa solitária deste abnegado. Com links do MediaFire! Não há como não favoritar.


Leonardo Rodrigues

domingo, 20 de julho de 2008

The Dark Knight


Um vilão psicótico. Uma bela mulher envolvida em um triângulo amoroso com o herói, de bela estampa e ironia refinada. Uma cidade dominada pelo crime e pela corrupção e uma população que, quando reunida, parece tremendamente estúpida. Essa poderia ser a descrição de um sem número de histórias e filmes de ação. Felizmente, The Dark Knight – que tem todos esses elementos – vai muito, mas muito além disso. O filme pega todos esses ingredientes e transforma em cinema da melhor qualidade.

Christopher Nolan dá à história uma aura de realidade. Sem ser histriônico impõe um tom de urgência em todas as cenas. Ficam claras as motivações de cada personagem. Mais do que lutar por uma causa maior, todos eles têm convicções pessoais e fazem escolhas. Têm vida própria. Não são reféns do roteiro. Por isso, tudo flui naturalmente. Por isso, não soa absurdo um homem vestido de morcego voando pela cidade. Por isso, mesmo conhecendo de cor e salteado os plots da trama, não sabemos para onde estamos sendo levados. Por isso, de bom grado, nos deixamos conduzir.

O Coringa criado por Heath Ledger não é um simples vilão. Em vez de ser a antítese do Batman é, muitas vezes, seu complemento. Não quer dominar o mundo ou ficar bilionário. Apenas se sente desafiado pela onipresença poderosa do ‘cavaleiro das trevas’. Dá à cidade o criminoso que ela merece. “É apenas uma cachorro correndo atrás de um carro. Alguém que quer ver o circo pegar fogo. Um agente do caos”. Está sempre um passo a frente, porque talvez compreenda como é previsível o comportamento humano. Sua presença em cena é incômoda e ameaçadora principalmente porque não se sabe exatamente o que ele busca, ao contrário do que diz o Batman em determinado momento do filme: ‘É fácil enfrentar os criminosos. É só saber o que eles querem’. Entre os dois há uma guerra de pontos de vista. Um está disposto a provar que a ‘loucura é como a gravidade: basta um empurrãozinho’ enquanto o outro acredita que apesar de idiota e mesquinha a humanidade pode ser imprevisível e dar mostras de grandeza. Coringa ‘perde’ a disputa exatamente por acreditar demais na previsibilidade, por desconsiderar que em meio a aridez e boçalidade pode surgir o singular, o imprevisível, o surpreendente. Lição que Christopher Nolan demonstra ter aprendido.

O filme foge do maquineísmo do bem contra o mal. Também escapa de se concentrar na dor psicológica que os heróis enfrentam por causa dos (super) poderes. Não cai na armadilha de abusar da pirotecnia dos efeitos especiais nem tenta contar uma história hermética e ‘cabeçuda’. Ele fica no ponto de equilíbrio de tudo isso. Acha uma personalidade própria em meio aos clichês do gênero. Agrada a gregos, troianos, romanos, espartanos... A quem vai atrás de entretenimento, só pra estimular algumas partes do cérebro e liberar hormônios, e a quem busca arte, para os quais o filme ainda reverbera na cabeça por dias a fio. Em uma palavra: definitivo.



Pedro Grossi

segunda-feira, 14 de julho de 2008

6 músicas para dias frios

Sorry Mr. Hornby.


1. King Crimson - Mate Kudasai

À exceção das “épicas”, o King Crimson nunca se deu lá muito bem com baladas. À base de dedilhados, slides e do Chapman stick de Tony Levin, "Matte Kudasai" rompe o dito. Dos pontos altos de Discipline, álbum que inicia a fase oitentista e não menos excelente da banda.



2. Scott Walker – It's Raining Today

Ele preteriu frenesis ao anonimato, fórmulas pré-concebidas à liberdade artística. Pagou caro por isso e, ainda assim, saiu-se consideravelmente bem. Influenciou de David Bowie a Beck e Radiohead, and keep going, raining and freezing.



3. Roberta Flack - Hey, That's No Way to Say Goodbye

De férias no Rio, em uma das freqüentes visitas ao ótimo sebo Baratos da Ribeiro, pesquei a jóia, o LP de estréia de Roberta Flack. Acompanhada de gente como Ron Carter e Bucky Pizzarelli. Aqui, recriando Leonard Cohen, chiada e lindamente.



4. Keith Jarrett - Part II C

Não faço muita idéia do que faz de uma música ideal para dias de baixas temperaturas, ou algo que o valha. De qualquer sorte, imagino. O último ato de Keith Jarrett em “The Köln Concert” me fornece bons indícios.



5. Piano Nocturne in Ebm

Nada mais enregelado que um noturno de inverno. Nada mais noturno que a obra de Frédéric Chopin.



6. The Dave Brubeck Quartet - Strange Meadow Lark

Tarefa ingrata compor o ínterim entre “Blue Rondo A La Turk” e “Take Five”. No entanto, esta é a minha faixa preferida de um disco simplesmente perfeito. E de certo não estou só.




Leonardo Rodrigues

quarta-feira, 9 de julho de 2008

Woody Allen

E se a vida fosse assim?



Por sinal (digital), ela já não é?


Leonardo Rodrigues

Wall E


Numa das primeiras aulas que tive no curso de jornalismo, lembro do meu professor de teatro, depois de horas discorrendo sobre a peça Romeu e Julieta, dizer que a obra era sobre o amor. Pensei: Duas horas de explicação pra depois você resumir tudo em uma palavra?
Meu raciocínio na época era que se toda história tinha uma moral, de uma ou duas frases, bastava dizer o desfecho edificante e jogar fora todo o resto. Eu não pretendia deixar de ler, ver ou ouvir histórias, era apenas um raciocínio hipotético de alguém que estava tentando entender melhor um monte de coisas. Como nunca cheguei a fazer a pergunta ao professor também nunca ouvi a resposta, mas, apesar de continuar sem entender um monte de coisas, já consegui esboçar uma solução pra minha dúvida. O valor das histórias não está em sua moral, mas na sua evolução. No carisma dos personagens e na identificação que criamos com seus medos e angústias. No universo criado e no qual temporariamente mergulhamos. Nos sofrimentos e dramas compartilhados, como se já não os tivéssemos em número bastante. Tudo para sentir o gosto da vitória no final. Para se entregar a um enredo que privilegie os bons e puna os maus. Para fugir da realidade e para encará-la ainda mais de perto. Se algo nisso tudo é dispensável, é a tal da moral. Grosseiramente falando o ensinamento de Wall E é: Preserve a natureza ou acabaremos em uma montanha de lixo. No entanto, para se chegar a essa conclusão nada complicada tem-se um dos melhores filmes de animação de todos os tempos.

A primeira meia hora supreende por dois motivos. Primeiro pela sublime visão pós apocalíptica da Terra. Arranha-céus de lixo compactado e nuvens de poluição são verdadeiras poesias visuais. Méritos para a direção de arte e para a excelente trilha sonora que sempre acerta o tom. A segunda supresa vem pela falta de diálogos. Os personagens falam com o corpo, sobretudo com os olhos. Por algum motivo, o pequeno robô Wall E (Waste Allocation Load Lifter-Earth-Class) foi deixado na Terra, depois que ela se tornou inabitável devido à poluição. Wall E foi projetado para compactar e empilhar lixo, função inútil já que a humanidade vaga sem rumo refugiada em naves espaciais. Ainda assim, ele continua cumprindo fielmente a sua função. Garimpando nas montanhas de entulho objetos que tragam um pouco de vida à sua solitária existência, Wall E constrói um lar. É tocante o seu apego por uma velha fita, que ele toca em um Ipod conectado a um vídeo cassete, do musical "Alô Dolly!", de 1969. Vendo o filme repetidas vezes, ele sonha, assim como fazem os atores do musical, em dançar de mãos dadas com alguém.

Na segunda parte do filme o seu sonho se mostra possível. Uma pequena robô chamada Eve (Extra- Terrestrial Vegetation Evaluator) é trazida à Terra para fazer um levantamento da situação do planeta. Só aí surge o primeiro diálogo do filme. E que diálogo! A cena dos dois robôs se apresentando - um ensinando ao outro a pronúncia correta do próprio nome - é simplesmente sensacional. Wall E mostra a Eve sua casa e o seu filme predileto. De repente "La vie en Rose" da francesa Édith Piaf na voz de Louis Armstrong. (Será que é mesmo um filme infantil?)

Eve volta para o espaço sideral e Wall E vai atrás dela no cruzeiro espacial onde os humanos se refugiam. Enquanto a humanidade se robotiza seguindo caminhos pré-programados como se fossem dados em um chip de computador os robôs se humanizam: sofrem, têm medo, compaixão, alegria, curiosidade.

O filme reúne as formas clássicas dos desenhos da Disney com a agilidade e inventividade das animações da Pixar. O resultado é assombrosamente bom. E que, para o nosso bem e para o bem do cinema, eles continuem se superando.





terça-feira, 8 de julho de 2008

O lugar-comum da violência

É difícil falar em violência sem cair nos clichês: Absurdo! Inaceitável! Barbárie!Mas não há opção. A banalização da violência levou à banalização do discurso. O que dizer do caso da criança de 3 anos que foi executada pela polícia? Meu limitado vocabulário não consegue ir além de absurdo, inaceitável e barbárie. Pra quem tomou a acertada decisão de evitar os noticiários policiais, os quais por obrigação profissional tenho de acompanhar diariamente, segue um resumo do que aconteceu domingo, 06/07, no Rio de Janeiro.

A visão da família: Uma mãe sai de uma festa de aniversário com seus dois filhos por volta das 19h. A poucos metros de casa vê um carro, um Fiat Stilo preto, em alta velocidade passar pela sua rua. Algum tempo depois, uma viatura policial, de portas abertas e com policiais armados com metralhadoras parece perseguir os bandidos. Para não obstruir a ação policial e para se ver o mais longe possível daquela situação a que os cariocas já estão se acostumando a presenciar, a mãe encosta o carro. De repente, barulhos de tiros. Os policiais começam a metralhar seu Pálio weekend cinza chumbo, com duas crianças dentro. Desesperada ela manda que os filhos se abaixem e corre para o frente do veículo tentando proteger a família. Em vão. Dos mais de quinze tiros disparados três atingem João Roberto Amaral, de 3 anos. Um deles na cabeça. Por sorte, nenhum tiro atingiu seu bebê de 8 meses.

A visão dos policiais: Um chamado no rádio avisa que assaltantes estão fugindo em um carro preto. No jogo de polícia e ladrão (está cada vez mais difícil saber quem é quem), policiais militares metralharam um carro quase preto (à noite todos os gatos são pardos) que cometeu o crime de estar na hora errada no lugar errado.

O secretário de Segurança Pública do Rio, José Mariano Beltrame (que, aliás, é cliente da FSB, onde trabalho) disse que os policiais confundiram o Pálio Weekend da advogada Alessandra Amorim Soares com o Fiat Stilo dos bandidos em fuga e que o engano teria causado a tragédia. Não foi tragédia. Foi crime. Sem atenuantes e sem justificativas. Não foi a primeira vez e temo que também não seja a útlima. Há algumas semanas uma criança de 4 anos morreu vítima de bala perdida durante um tiroteio em morros cariocas. Daquela vez, pôde-se argumentar fatalidade já que a bala era ‘perdida’. No caso de domingo, no entanto, as balas foram endereçadas. Era pra matar quem quer que estivesse naquele carro.

De oficiais do exército em atitude de Pilatos que entregam jovens para serem executados por bandidos rivais a crianças baleadas na cabeça e arrastadas pelas ruas presas aos carros vamos nos matando. Da periferia ou da classe média. Mais um João se vai nessa terra de ninguém.


Pedro Grossi