quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Em quatro

Um disco: Enquanto os refletores ainda giram sobre a triunfal reunião do Led Zeppelin e as especulações sobre a viabilidade de uma turnê mundial, "Raising Sand" passa quase à meia luz. Trata-se do mais recente trabalho de Robert Plant, lançado em outubro último. Longe da Strange Sensation, banda que o acompanha desde o início da década, o dono dos cachos mais reluzente do rock une forças com a futura diva norte-americana do bluegrass Alison Kraus. O resultado, uma jóia de beleza rústica e bem acabada, com releituras de Tom Waits, Gene Clark e Townes Van Zandt; e que já contabiliza loas tecidas por crítica e público. Sem dúvida, um dos melhores álbuns do bom ano de 2007.


Um filme: Estranha mesmo é a sensação ao adentrar no requintado Shopping da Gávea, local de concorridas casas de teatro e point do elenco da Malhação, para assistir a algo como o autobiográfico La Faute à Fidel!” (“A culpa é do Fidel!”). Na película francesa, estréia de Julie Gravas na direção, a pequena Ana (Nina Kervel-Bey) se vê obrigada a abrir mão dos mimos de classe média parisiense quando os pais aderem à causa socialista. Ambientada no início dos anos 70, impossível não remeter ao olhar infantil sobre o desenrolar da história de produções como “Machuca” e “O Ano Que Meus Pais Saíram de Férias”. Mas aqui, de uma maneira mais branda. Com um humor que é suavemente construído através de um inusitado conflito entre pais de esquerda e uma filha nitidamente reacionária. Distorções capazes de furtar gargalhadas em ex-militantes que agora pagam 20 reais para abarrotar salas da Vivo com lugares marcados. Um filme sobre pessoas, como "Fidel" e eu gostamos.


Um livro: Sempre fui fã de biografias, e este é um filão que parece mais em alta do que nunca. Não li, mas fiquei curioso com “The Measure of a Man: A Spiritual Autobiography”, autobiografia de Sidney Poitier, ainda inédita no Brasil. Mesmo que incorra nos riscos óbvios de uma história crivada pelo próprio ponto de vista, Sidney definitivamente não é o tipo de homem que tenha algo a guardar. Da infância humilde nas Bahamas, passando pela frustração na primeira tentativa de entrar no showbusiness e a glória em romper barreiras raciais e se tornar o primeiro negro a receber um Oscar, por “Lilies Of The Field” ("Uma Vez Nas Sombras”), de 63. Editado em 2000, o livro recebeu nova edição no ano passado, marca do octagésimo aniversário do ator, diretor e ícone - além de um jantar de gala no “Ophra Winfrey Show”.


Um programa de TV: Nem Marta Suplicy, nem Penélope Nova. Nenhuma delas chega perto da sapiência e desenvoltura de Sue Johanson. Do alto de seus 77 anos, esta simpática senhora canadense comanda o "Talk Sex" ("Falando de Sexo"), exibido nos EUA pelo canal a cabo Oxygen e por aqui pela GNT. No programa, sem quaisquer papas na língua nem vulgarismos, Sue responde às dúvidas mais íntimas dos telespectadores. Didática, ela se vale de uma espirituosidade ímpar e dos mais variados aparatos e reproduções genitais. Tudo para que todos os “is” sejam devidamente pingados. Tem coisas que só o tempo ensina. Há mais de trinta e cinco anos ela trabalha como conselheira sexual, possui uma série de livros publicados e é dona da própria marca de “sex toy”, a “Talk Sex Royal Line”.



Leonardo Rodrigues

domingo, 27 de janeiro de 2008

Sorin



Ainda existe, em tempos de futebol 'profissional', amor à camisa. Abaixo reproduzo a carta em que Juan Pablo Sorin se despede do Cruzeiro depois do título da Sul-Minas de 2002.


Há quatro meses conquistamos a Copa Sul Minas. Há quatro meses fui embora do Cruzeiro. O texto abaixo escrevi para mim, porém, senti a necessidade de compartilhá-lo com vocês. Simplesmente para que saibam a importância que tudo isso tem na minha vida. Simplesmente para seguirmos juntos, apesar da distancia. Hoje, estréio em meu novo time. São muitas as expectativas e as vontades de sempre, mas esperando um dia retornar a minha segunda casa.


15:58 hs – Banderas en tu corazón (Bandeiras no teu coração).

Setenta e cinco mil caras esperando ver o Cruzeiro campeão. Saímos rodeados de mascotes e crianças, que nos acompanham sempre com um sorriso. Pegamos forte e corremos para o gramado. Uma olhada rápida, mãos para o alto e as primeiras emoções. Não é comum e é até anormal muitas camisas argentinas, celestes e brancas, no Brasil todas sentimentalmente distinguíveis. Chegam as placas de homenagem. Primeiro, do presidente. Depois, da Máfia Azul e logo uma camisa inesquecível com o meia dúzia nas costas, assinada por todos os funcionários do clube. A melhor homenagem, da cozinheira ao roupeiro, os encarregados da limpeza, até meus colegas, médicos, técnicos... Vale ouro! Vale mais suor, ainda! Sorteio a moeda da Fifa. Deu branco e ganhei. No segundo tempo, atacaremos junto ao grosso da nossa torcida. Antes de começar toca o hino brasileiro. Todos cantam e eu não. Procuro minha companheira e concentro-me em silêncio. Observo a torcida e na arquibancada há uma bandeira argentina. Que orgulho! Não posso acreditar. Onde estão meus amigos do bairro para contar-lhes? Jogam balões para os céus com meu rosto estampado numa bandeira vertical. É minha despedida, a parte da final. Contenho as lágrimas, soa o apito.

16h20 - Sarando as feridas

Meu Deus! Um choque forte, toco a sobrancelha. Sangue. Puta que pariu! De novo? Quarto corte na cabeça em dois anos e meio. Queria jogar e o juiz reserva "canarinho" disse-me que não! Quase pede minha substituição e disse-me que há muito sangue. Peço-lhe por favor. Hoje, não me deixes de fora, irmão! Ele não entende bem, mas me permite entrar e lá vou eu como um "papai smurf". Serão seis pontos no intervalo, 0 a 0, com uma bola na trave e um susto forte.


17h40 - Oh meu pai, eu sou Cruzeiro meu pai...

Tira a camisa! Tira a camisa! Parece uma bola perdida, mas sei que o Ruy vai ganhá-la. O "cabeção," meu amigo e parceiro de quarto, vai tocá-la por um lado e buscá-la pelo outro (fez uma gaúcha, berra o locutor). Entra na área e só rola para trás. Não sei o que faço aí, a não ser confiar nele. Não sei o que faço senão ir além do sonho da despedida e não há tempo para pensar. Com três dedos e meio esquisitos de prima, com a sempre canhota bendita e a rede se mexe, é o mundo que explode, vem o delírio, a festa... Não pode ser real. As cabecinhas que pulam descontroladas, a camisa voando na mão e um grito eterno, inesquecível, uma dança especial.


17h55 - Ah, eu tô maluco!

Bicampeão!Faltam segundos e não existe sensação comparável como a de ser campeão. Nos olhamos cúmplices com o Cris e rimos da conquista depois do esforço. Somos irmãos, somos um punhado azul de raça inquebrantável, enquanto o pessoal na arquibancada baila, grita, goza e por fim estoura com o final. Escuta-se um estrondo inconfundível. Um abraço, dois, um milhão, a correria perdida, louca, entre pulos, festejos com cada companheiro, Toninho, Valdir, Tita e Bolinha, todos malucos. De repente um cara me leva nas costas e damos a volta olímpica. Não quero que isso termine e penso se pudesse parar o tempo nesse instante, mas não posso. E aí, vou dando-me conta que também é o final para mim, que estou indo embora do meu time, da minha cidade, da minha gente. Então, vem a enorme emoção e comemoro como sempre, desenfreado, sem limites, como se fosse a última vez. Comemoro e cumprimento cada canto do maravilhoso Mineirão. Despeço-me e quero abraçar a todos. Quero que dêem a volta conosco, quero dizer-lhes que eles não sabem como necessitamos de todos aqui dentro. Vejo as faixas e ainda não acredito. Vejo os rostos de alegria e até hoje nada sai da minha mente. Depois de tudo, a surpresa com a presença de minha mãe exatamente no Dia das Mães e é impossível não chorar. Finalmente, recebo a Copa tão desejada. É bonito ser capitão. É grandioso ser capitão do Cruzeiro e ser campeão. Levantamos a taça, desfrutamos e saímos a oferecer aos milhares que estavam por todas as partes até o cansaço. Imagino Minas. Imagino Belo Horizonte. Tudo se acaba e não podia ser tão perfeito. Será que sonhei?Nem um sonho seria tão incrível. Estou partindo e pensando se algum outro dia serei tão feliz!


Juan Pablo Sorin



Pedro Grossi

domingo, 20 de janeiro de 2008

Notas de interesse médio

Há 25 anos morria Garrincha. Uma espécie de Macunaíma do futebol brasileiro: um anti-herói feio, torto e desingoçado; mais brasileiro impossível. A habilidade dentro de campo era assustadora, fora dele foi presa fácil. O álcool tirou sua vida e sua chance de disputar o trono mundial do esporte. Em vez disso, jaz abandonado em algum túmulo do subúrbio carioca sem nenhuma das honrarias que não seriam o bastante para reverenciar sua arte.

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A chapada gaúcha e as cataratas de Foz do Iguaçu serão cenário do próximo filme do Indiana Jones - Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal. Ainda não se sabe o que o personagem de Steven Spielberg vai fazer no Brasil, mas foi filmado um bote - vazio - caindo das cataratas para que, possivelmente, Harrison Ford, que não veio para as filmagens, seja inserido digitalmente na pós-produção.

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Pelo andar da carruagem, a chifruda número 1 da América será a representante do Partido Democrata à presidência dos Estados Unidos. Hillary venceu as prévias no estado de Nevada. Na 'super-terça', no próximo dia 5 de fevereiro, mais 20 estados devem realizar as prévias. Quem vencer a disputa entre Obama e Hillary tem grandes chances de se mudar pra Casa Branca, já que os candidatos do partido republicano são pouco carismáticos e o país clama por uma renovação depois de dois mandatos desastrosos de Bush filho. Resumo da ópera: Provavelmente ou uma mulher ou um negro filho de quenianos e neto de muçulmanos (e que tem o sobrenome Hussein) herdarão o Império (em recessão) americano.

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Há muito que o carnaval carioca financia ou bicheiros ou traficantes. Além disso, os enredos não passam de propagandas de governos ou prefeituras que pagam para terem sua epopéia contada. Tudo endossado pela grande mídia e porque não dizer pelo governo. É a prefeitura de Recife, por exemplo, que está bancando parte do carnaval da Mangueira, escola que está sendo investigada por facilitar - e comandar - o tráfico de drogas no homônimo morro onde a escola se localiza. Não precisa ser investigador de polícia pra saber que os tempos românticos de Cartola não existem mais. É claro que isso não é exclusividade da Mangueira. Quem não se lembra que o presidente da Beija-Flor (minha escola da infância) foi um dos presos na megaoperação da polícia federal feita no começo de 2007 que caçou os graúdos da máfia dos caça-níqueis e que foi inclusive acusade de comprar o título do carnaval?

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A diferença entre a extrema direita e a extrema esquerda é só o tamanho do bigode.